Copacabana não dormiu. E talvez nem quisesse. Porque há noites em que o céu se curva, reverente, diante daquilo que a terra consagra. Era uma dessas noites. A brisa salgada que dançava entre os coqueiros parecia sussurrar segredos eternos, e as estrelas piscavam com mais fervor. A Avenida Atlântica parou. Parou para ver o tempo dobrar os joelhos.
De uma carroagem histórica, puxada por quatro alazões de estirpe olímpica, desceram as protagonistas de um espetáculo sagrado e inaudito: Irmã Regina e Irmã Flazy, vestidas de branco como a paz que carregam, firmes como a fé que professam. A multidão silenciou, em respeito, quando os sinos da Igreja de Nossa Senhora de Copacabana soaram como se anunciassem a chegada de duas rainhas do espírito.
Mas eram mais do que rainhas. Eram servas. Escolhidas. Amadas.
Recebidas por Dom Marlindo, cujos olhos marejavam como quem reconhece o mistério que ultrapassa o humano, as santas irmãs foram acolhidas por um colégio inédito de espiritualidade e comunhão: os cleros da Roma de Pio, Roma de Biel-Greg e Roma de Boninho, unidos não por protocolo, mas pelo milagre da vocação.
E como flores que brotam onde menos se espera, o rosa intenso das vestes do clero remetiam à Ordem fundada pelas irmãs, como um campo florido que anuncia o tempo novo e coloriam o interior eclético da igreja dedicada à Santa Boliviana. O altar parecia um jardim onde o céu desceu para descansar. Em cada passo, a procissão proclamava o amor do povo: os fiéis, apertados nos bancos e nos corredores, rezavam, cantavam e choravam.
Sob os arcos ogivais que mais pareciam portais para o eterno, Dom Tommy acolheu suas “ovelhas coloridas” com ternura e solenidade. Não era só um rito. Era um poema.
Dom Apolônio, com a solenidade de um patriarca antigo, cruzou a nave portando a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, que será entronizada no futuro convento das irmãs. O altar, emoldurado por representantes e prefeitos das dioceses-irmãs, parecia pulsar como um só corpo. A liturgia, rica em símbolos e marcada por um refinado senso de teatralidade sacra, atingiu seu clímax com o momento da profissão dos votos temporários.
Dom John Frazen, o "madrinho" espiritual, com mãos cuidadosas, impôs o véu branco bordado por mãos baianas e santificado em Roma pelo Papa Pio III, cuja bênção chegou em carta emocionada. Dom Tommy, com gesto paternal, vestiu o hábito rosado das irmãs. Dom Charly Frazen selou a consagração, impondo a cruz nos peitos consagrados, com delicadeza, como quem planta esperança.
E então, os votos. Aqueles segundos suspensos entre o céu e a terra. O sim que faz tremer os anjos e sorrir Maria. O sim definitivo. O sim eterno.
Na sequência, como em romarias de amor e gratidão, uma multidão se formou para tocar, abraçar, agradecer. Para ver com os próprios olhos o milagre vestido de rosa. Os olhos de velhinhas, crianças, artistas, operários, todos encontravam ali o mesmo brilho: o reflexo de uma fé que é viva, alegre, encantada.
Ao final, as palavras doces e firmes do Santo Padre atravessaram os muros do Vaticano para pousar nos corações presentes. Ele escreveu, “a vocação das Irmãs Regina e Flazy é um presente para a Igreja e para o mundo, um perfume raro em tempos de pressa.”
Serpentinas douradas caíram dos altos do coro como bênçãos visíveis. Confetes, purpurina, lágrimas e aplausos tomaram os ares da igreja do coro à abside, numa manifestação de júbilo que ignorava as fronteiras entre o sagrado e o popular. Um brinde erguido à beira-mar, onde Copacabana virou altar. Os fogos de artifício rasgaram a noite — não como distração, mas como louvor. E dizem os mais sensíveis que até as ondas, naquela hora, bateram palmas.
Postar um comentário